Arquitetos nunca tiveram uma posição de mais suprema proeminência do que na visão de Buckminster "Bucky" Fuller. Para ele, apenas os arquitetos eram capazes de compreender e navegar as complexas inter-relações da sociedade, tecnologias e meio ambiente, visto através do paradigma compreensivo da teoria dos sistemas. A arquitetura, neste modelo, era destinada a existir em contato estreito com tanto a humanidade como a natureza, exercendo o papel mais crítico da civilização em elevar o estado da humanidade e promover sua gestão responsável do meio ambiente. Emergindo da positividade ética do modernismo do pós-guerra, esta perspectiva meliorista marca, talvez, o auge da ascensão do otimismo no pensamento de meados do século XX, e deu a Fuller um diagrama exclusivamente moral para seus projetos revolucionários.
Foi a partir deste contexto social e filosófico que Fuller concebeu seu projeto para a Biosfera de Montreal, o pavilhão dos Estados Unidos para a Exposição Mundial de 1967. Por quase vinte anos, Fuller vinha aperfeiçoando seus projetos de cúpulas geodésicas, pontilhando o país com edifícios experimentais de aparência esférica e constantemente cultivando sua notoriedade profissional e popular. Sua obsessão com este tipo particular de estrutura emergiu de seus interesses na eficiência material, integridade estrutural e modularidade, os ingredientes-chave do que ele esperava que se tornaria uma intervenção de design sustentável, facilmente replicável. Implantando essas cúpulas em todos os lugares desde restaurantes a instalações militares, a estrutura versátil tornou-se singularmente associada com Fuller, como foi humoristicamente ilustrado através de uma capa de janeiro de 1964 na Revista Time.
De todos os domos de Fuller, a biosfera é talvez o mais espetacular. Em um diâmetro de setenta e seis metros, a esfera expansiva atinge espantosos sessenta e dois metros para o céu e domina completamente a ilha em que está localizada. O volume contido dentro dele é tão espaçoso que acomoda confortavelmente um edifício de exposições de sete pavimentos, destacando os vários elementos programáticos da exposição. Mesmo em meio a outras atrações impressionantes, incluindo o pavilhão alemão, de estrutura tensionada, de Frei Otto e o icônico Habitat 67, de Moshe Safdie - a Biosfera reinou suprema, atraindo mais de 5,3 milhões de visitantes nos primeiros seis meses após sua abertura. [1]
Geometricamente, a cúpula é um icosaedro, uma forma de 20 lados formado pela intercalação de pentágonos em uma grade hexagonal. No entanto, a clareza dessa forma é ofuscada pela fragmentação das suas faces, que são subdivididas em uma série de triângulos equiláteros com mínimas distorções que curvam as seções planas individuais em conchas. Como resultado, a composição agregada da cúpula esférica é substancialmente mais esférica do que simplesmente icosaédrica, enquanto as unidades menores criam uma complexidade visual através da pura repetitividade. Essa estrutura em grade é criada inteiramente de tubos de aço de três polegadas, soldados nas articulações e afinando-se suavemente em direção ao topo da estrutura, com o intuito de otimizar a distribuição das forças através do sistema.
Originalmente revestida com uma membrana acrílica fina que foi destruída pelo fogo em 1976, a cúpula como foi originalmente construída era mais opaca e visualmente sólida do que a versão atual. No entanto, sua presente nudez estrutural, embora não intencional pelo arquiteto, cria uma transparência muito bem legível que revela plenamente a ingenuidade do projeto de Fuller. Do lado de fora do edifício, linhas de visão através da esfera penetram a casca em duas superfícies sem diferenciação de materiais, resultando em uma leitura contínua de superfícies interiores e exteriores como facetas de uma única malha estrutural curvando-se sobre si mesma. Com o enchimento acrílico removido, a ênfase experimental do domo muda do fechamento espacial à maravilha sensorial da própria estrutura. A visibilidade não coreografada do interior do edifício de exposição, no entanto, é perdoavelmente menos atraente, por vezes se assemelhando a uma tomada inquietantemente moderna no kitsch do globo de neve em uma escala enorme.
Como uma realização arquitetônica, a Biosfera resume a idealização da promessa de tecnologia de Fuller. Através de uma análise holística, sistematização e produção em massa, ele viu este projeto como um exemplo de como os arquitetos poderiam exercer e implantar os instrumentos de inovação para criar novas espécies de máquinas hiper-eficientes para o bem da humanidade. A beleza das geometrias puras da Biosfera foi um bônus estético, o sucesso intencional, mas subordinado, de um funcionalista e exercício ético. No entanto, a capacidade da estrutura para comunicar essa mensagem de otimismo através da otimização pode ter sido perdida para aqueles que buscaram e lutaram para encontrar aplicações práticas para a invenção de Fuller. Embora as estruturas de cascas tenham sofrido como dispositivos padrões no repertório da arquitetura internacional, as cúpulas geodésicas, em particular, nunca alcançaram a adoção em massa que Fuller esperava, e seus trabalhos idealistas foram traduzidos em poucos ganhos tangíveis para a condição humana que ele ansiava melhorar.
Infelizmente, a filosofia exclusivamente esperançosa de Fuller sobre o poder do arquiteto e o potencial da tecnologia foi recebida com a mesma recepção de ceticismo intrigado que se abateu sobre sua cúpula. Em resposta às agitações sociais do final dos anos 1960 e os cada vez mais aparentes fracassos do modernismo, os teóricos começaram a afastar-se do positivismo ético e do humanismo em geral, em sua busca por um significado mais profundo na arquitetura. Logo, com a chegada difundido de teoria pós-estrutural e suas devoluções, a convicção de Fuller na primazia de um imperativo moral arquitetônico foi praticamente abandonada pelos seus pares. Após o incêndio de 1976, a Biosfera foi abandonada e isolada do público, um monumento trágico para uma era passada de esperança e idealismo.
Em 1990, após quase 15 anos em desuso, a Biosfera foi comprada pelo governo canadense e reutilizada como um espaço de exposição ambiental, dedicada a promover uma compreensão do rio St. Lawrence e do ecossistema dos Grandes Lagos. Foi uma homenagem a Fuller, que tem sido amplamente reconhecido como um dos primeiros arquitetos a trazer o conceito de sustentabilidade em seu uso global. O renascimento da Biosfera também marcou o surgimento da teoria da sustentabilidade como um realinhamento do pensamento arquitetônico com as preocupações mundanas que a academia já havia descontado, validando a defesa incansável de Fuller de uma profissão da arquitetura baseada em serviços para a natureza e a humanidade.
[1] “Richard Buckminster Fuller: A Visionary Architect.” Environment Canada. Acesso em 18 Novembro de 2014 em http://www.ec.gc.ca/biosphere/default.asp?lang=En&n=30956246-1
[2] Mallgrave, Harry Francis and David Goodman. An Introduction to Architectural Theory: 1968 to the Present. Wiley-Blackwell, United Kingdom: 2011.
[3] Martin, Reinhold. "Crystal Balls." ANY: Architecture New York, No. 17, Forget Fuller? Everything you always wanted to know about Fuller but were afraid to ask (1997), pp. 35-39.
[4] Section Drawing: Kalin, Survey of Building Materials, Systems, and Techniques. From Massey, Jonathan. "Buckminster Fuller's Cybernetic Pastoral: The United States Pavilion at Expo 67." Journal of architecture 11.4 (2006): 463-83.
- Ano: 1967